09/08/2014




Você Maior

As redes soci­ais ali­men­tam, mas não são as úni­cas res­pon­sá­veis pela ego­la­tria que tomou conta do mundo. Vivendo numa bolha cha­mada soci­e­dade de con­sumo, cada um de nós pas­sou a ser enca­rado como um pro­duto e, como tal, pre­cisa se “ven­der”. Para se colo­car bem no mer­cado do amor e no mer­cado de tra­ba­lho, tornou-se obri­ga­tó­rio apre­sen­tar um per­fil, e então tra­ta­mos de falar muito sobre nós, sobre nos­sos atri­bu­tos e de tudo o que possa fazer a gente avan­çar em rela­ção à con­cor­rên­cia, que não é pequena. Somos os publi­ci­tá­rios de nós mes­mos, uns mais dis­cre­tos, outros mais exi­bi­dos, mas todos pro­cu­rando encan­tar o pró­ximo, que pro­pa­ganda nada mais é do que isso: a arte de sedu­zir.
Con­tra­di­to­ri­a­mente, quando se torna neces­sá­rio falar­mos não de nos­sos atri­bu­tos, mas de nos­sas dores, de nos­sas inse­gu­ran­ças e de nos­sos defei­tos, fecha­mos a boca. Mesmo os que estão bem perto, aque­les que nos são ínti­mos, não escu­tam a nossa voz. Cala­mos por temer um jul­ga­mento sumá­rio. Pro­du­tos pre­ci­sam ser efi­ci­en­tes, não podem ter falhas.

A boa notí­cia é que tudo isso é um absurdo. Não somos um pro­duto. Não pre­ci­sa­mos de slo­gan, emba­la­gem, jin­gle. Esta­mos aqui para con­vi­ver, e não para ser­mos con­su­mi­dos. E se qui­ser­mos que real­mente nos conhe­çam, o ideal seria parar de nos anun­ci­ar­mos como o último copo d´água do deserto.
O docu­men­tá­rio Eu Maior, um dos tra­ba­lhos mais tocan­tes que assisti nos últi­mos tem­pos, traz o depoi­mento de filó­so­fos, artis­tas, cien­tis­tas e ambi­en­ta­lis­tas sobre quem ver­da­dei­ra­mente somos e como deve­mos nos rela­ci­o­nar com o uni­verso. Entre várias
colo­ca­ções pon­de­ra­das, teve uma de Marina Silva que tomei como uma lição de com­por­ta­mento: “Você des­co­bre a qua­li­dade de uma pes­soa não quando ela fala de si, mas quando ela fala dos outros”.
Ou seja, o que revela sua ver­da­deira natu­reza são os comen­tá­rios vene­no­sos que cos­tuma dis­tri­buir ou os elo­gios que faz sobre ami­gos e des­co­nhe­ci­dos. São as fofo­cas que oculta para não menos­pre­zar seus seme­lhan­tes ou que espa­lha com gosto por aí, acres­cen­tando uma mal­da­de­zi­nha extra. Você é ava­li­ado de forma mais pre­cisa atra­vés da sua capa­ci­dade de enal­te­cer o posi­tivo que há ao seu redor ou de pro­pa­gar o nega­ti­vismo que sobres­sai em tudo o que vê. Você demons­tra que é uma pes­soa maior – ou menor – de acordo com sua neces­si­dade de dimi­nuir ou de valo­ri­zar aque­les que o rodeiam, de acordo com um olhar que deve­ria ser justo, mas quase sem­pre é ape­nas com­pe­ti­tivo. É atra­vés das suas pala­vras amo­ro­sas ou das suas decla­ra­ções inju­ri­an­tes que os outros sabe­rão exa­ta­mente quem é você – pouco impor­tando o que você diz sobre si mesmo.

Sobre você mesmo, deixe que fale­mos nós.
Martha Medeiros

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